O trabalho de Vane Barini tem o título de "Momento" (2006-2009) série 1. Os trabalhos aqui apresentados são fotografias de uma fotografia matriz que foi escolhida pela artista. Nela vemos uma rua cheia de pessoas caminhando, que são vista por cima, formando um ângulo tal que produz deformações em suas figuras. O sol, que ilumina estas pessoas andando encontra-se inclinado em sentido oposto ao da lente da câmera que captou a foto matriz, o que provoca uma maior deformação das figuras com a sombra alongando as figuras a partir de seus pés. O trabalho artístico de Vane Barini consiste em isolar, em outra foto, figura ou figuras e suas sombras, em fundo branco,retiradas da matriz utilizando uma técnica de revelação, de tal forma que pareçam aquarelas ou aguadas de nanquim. É de uma beleza que impressiona tanto pelo isolamento destas figuras como pela escala diminuta em que são revelados exigindo um olhar atento para aquelas pequenas figuras que vão se revelando a nossa vista. Neste sentido, nos lembra o Impressionismo em gestos diminutos embora o registro não é o de um gesto e sim de uma mancha de impressão que se assemelha a uma aquarela reduzida. A solidão e a multidão são paródias do trabalho e suas figuras lembram Alberto Giacometti  em suas esculturas alongadas. Podemos comparar com o mesmo efeito de alongamento nas imagens, que tem na continuidade da figura e de  sua sombra, a impressão de se formar uma única imagem de característica mais abstrata. As fotografias de Vane Barini são delicadas e nos revelam também, entre a beleza de sua apresentação, os segredos de sua miniaturização.
Marco do Valle

 

PARA SE PERCEBER A PAISAGEM

Do extenso trabalho construído por Vane Barini no campo da Fotografia evidencia-se seu interesse contundente pela paisagem. Terras distantes, megalópoles, árvores e toda sorte de pessoas que sob outra perspectiva distinguem-se umas das outras, são persistentemente buscadas pela artista até que, ressemantizadas, têm sua singularidade revisada.
A combinatória entre técnica apurada, crescente grau de experimentação e atenção aos contextos do mundo contemporâneo presentes nas séries atuais não organizam necessariamente uma chave de leitura particular ou inusitada para sua produção, mas nos oferece uma oportunidade conceitual bastante instigante para a leitura dos trabalhos apresentados nessa exposição.
Para se perceber a paisagem construída pela artista devemos considerar o imbricado jogo de regularidades e irregularidades que organizam as imagens que ela nos propõe por meio da fotografia e do vídeo. É possível perceber que regularidade e irregularidade fundamentam a sintaxe visual produzida nos trabalhos criados especificamente para esse espaço tanto quanto indicam o estado de atualidade dos conteúdos aos quais se referem esses registros de paisagem. Talvez por isso Vane insista em nos indicar que vê o que não vê de fato. O conjunto dos registros organiza-se de modo randômico, dado ora pela cor, ora pelos volumes, ora por suas simbologias ou potências espaciais. É assim que ela cria linhas sequencias de horizontinhos ou novas praças, ou mesmo estabelece a vizinhança dentre tantas cabeças de gente que coleciona.
A paisagem trabalhada por Vane é derivada direta da compreensão que lhe aplica o geógrafo Milton Santos: não se cria só de uma vez, mas por acréscimos e substituições, por sua heterogeneidade. Já não trata exclusivamente dos elementos inanimados abrigados pelo alcance da vista ou particularidades da natureza. Além dos territórios, contêm em sua constituição, seus sujeitos. Além da natureza, apresenta as artificialidades que constroem o mundo como ele é visto.
A estratégia adotada por ela para elaborar essas imagens estabelece estreita conexão com o estatuto contemporâneo à medida que promove mais uma dobra na conhecida relação olho/máquina/objeto. Vane acrescenta a essa trama uma espécie de condição de agenciamento para o trabalho. Partindo do interesse crescente, nos últimos anos, pelos elementos moventes da paisagem (pessoas no lugar de coisas) ela passa a escolher determinadas cenas urbanas que, antes mesmo de configurarem-se como interessantes, são situações reveladas a partir de anteparos que passam a conduzir a construção das imagens. Desse modo, configura um determinado distanciamento dos seus objetos de estudo, como se estivesse conduzindo um estudo de comportamento. Assim, admira e mira os sujeitos que não a percebem em pleno ato de captura. tomadas a partir da distância dos anteparos (nesse caso a janela) com o que a artista constrói séries de narrativas intermediadas em sua busca por revelar ausências, belezas e solitudes. A linguagem da instalação artística é ordenada pela fotografia e ocupa nessa exposição as duas ambiências principais. A espacialização dos trabalhos e imagens aqui dispostos sugerem sua leitura pela via cromática: o primeiro encontro do espectador se dá numa sala azul por onde desfilam ou flutuam pessoas desavisadas numa praça em Roma. A sequência nos leva ao corredor onde nucas, partes das costas, cabelos, chapéus e adereços esboçam espectros de subjetividades do mundo todo. Centenas delas, selecionadas a partir de arquivos mais numerosos ainda, são as imagens escolhidas para formar um grupo de sujeitos vistos e registrados, sujeitos que sequer desconfiam dessa condição de retrato às avessas, criada por Vane para esse trabalho. Por fim, encontramo-nos com o vídeo que igualmente nos revela ações cotidianas de pessoas comuns, urbanas, tomadas a partir da distância dos anteparos (nesse caso a janela) com o que a artista constrói séries de narrativas intermediadas em sua busca por revelar ausências, belezas e solitudes.
Prof. Dra. Sylvia Furegatti
Instituto de Artes da Unicamp 2015
 

 

ÁRVORE DE NUVENS

Vane Barini também invoca as árvores em seu trabalho fotográfico. Derivadas de uma visita a um parque na Croácia, no ano de 2008, essa série de fotografias intituladas Árvores de Nuvens foi produzida com máquina analógica, ampliada e impressa sobre papel Turner. A série traz elementos que estendem a lógica com a qual usualmente
compreendemos a paisagem. As imagens das árvores encontram-se entre um lago transparente e os reflexos de um belo céu azulado. O jogo de luzes capturado pela máquina da artista põe uma e outra faixa da paisagem à prova: para compreender essa paisagem o observador deve encontrar a árvore submersa na água, ao invés de fora dela. Acostumados às maquinações que a imagem digital nos permite, somos surpreendidos por uma condição de verdade pouco usual, para a qual não estamos devidamente preparados e com a qual lida, desde sempre, a linguagem da fotografia contemporânea.
Prof. Dra. Sylvia Furegatti
Instituto de Artes da Unicamp
2013.

 

Imagens errantes

Dessa mesma poesia em forma de rochas e pedras, habitam Primal, as imagens de Vane Barini, que nos movem, pela força e densidade, e nos levando a viajar por sua paisagem de histórias, mundo afora, com seu olhar de ângulos sinuosos, que configuram quadros, recriam belezas e inclinam pensamentos. O que podem nossos olhos decifrar de todos os enigmas que o outro ainda não criou ou de todos os mistérios que a vida ainda guarda?
Prof. Dra. Fabiana Bruno
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp
2013

 

fora de si

Antropoantro no Cubo Branco
Vane Barini, quem disse que ela é fotógrafa? Com Fora de Si ela surpreende os apreciadores de sua arte como fotógrafa, aqueles que esperavam ver fotografias. Um cubo todo pintado de branco, com uma escada também branca encostada no fundo pode até ser fotografado e resultar em belas fotos, mas não é fotografia. No entanto, ele
tem tudo a ver com fotos feitas por Vane Barini. O que há de comum entre Fora de Si e os retratos mostrados na Comunitária, o Com-viver apresentado no Casarão, e o trabalho Sem Título instalado nos vidros do hall central da Esamc? Os três últimos são fotografias, mas o que os distingue e une a Fora de Si é o ponto de vista inusitado que apresentam: os retratados de costas para a câmera, a multidão exposta numa fotografia invertida de ponta cabeça, os detalhes minuciosos de um jorro de água. Fora de Si, em sua singela brancura, convida o freqüentador de No Cubo Branco, a ver a exposição de um ponto de vista inusitado – do alto da escada, numa visão de cima. Uma visão que abarca todo o espaço do Cubo Branco, que permite apreciar os outros sete cubos (e o meio teto do oitavo) de um outro ângulo e em conjunto, que possibilita outras visões do público, das sombras, das coisas, de todo o conjunto da exposição. Fora de Si aponta para todo o trabalho de Vane Barini: a busca constante de pontos de vista inusitados, outros...
Lalau Mayrink
Instituto de Estudos de Linguistica da Unicamp
2007